segunda-feira, 8 de abril de 2013

CANDIDO PORTINARI








Muitos artistas dedicam a vida aos registros da cultura de seu povo e de seu país.
No Brasil, Candido Portinari foi um deles. Sua extensa obra nos faz viajar no tempo, através da história.

Café, 1935. Óleo sobre tela, 130X195cm. Museu nacional de Belas Artes - RJ

Esse quadro por exemplo, foi muito importante para a sua carreira e para as artes plásticas no Brasil. Foi também premiada nos Estados Unidos. A obra revela claramente um Portinari preocupado com a vida dos trabalhadores rurais. A rotina do trabalho, as roupas, as dificuldades, tudo ficou registrado.
O artista mostra o ambiente rural, uma fazenda de café. Porém, mais do que tudo, ele nos faz perceber o árduo trabalho do campo. Observe a cor marrom predominante na tela. Não há céu, não há horizonte, há sim, uma fila interminável de trabalhadores. Podemos até imaginar seus movimentos.  Veja novamente a tela inteira. Portinari nos intriga quando deixa somente um rosto à mostra,  mistura a terra aos corpos, mostra o jeito autoritário do capataz, uma tela com movimento, força, drama.

A obra de Portinari sofreu forte influência de seus primeiros anos de vida. Sua querida Brodowski, cidade do interior paulista, onde nasceu em 29 de dezembro de 1903, seria lembrada em sua pinturas.
Candinho, como carinhosamente era chamado, sempre foi miúdo e tinha dificuldade para andar por causa de um acidente. Esse fato foi marcante para o franzino garoto que achava seus pés pequenos e fracos.
Na fazenda Santa Rosa, onde morava, observava os colonos trabalhando na roça, principalmente seus  pés, com dedos enormes e fortes.
Desde pequeno, gostava de desenhar e pintar. Aos 9 anos de idade, trabalhou como auxiliar na pintura do forro da Igreja de sua cidade. Ele ficou encarregado de fazer as estrelas. Aprendeu então, o Spolvero, uma técnica de pintura em que se utiliza um saquinho cheio de tinta em pó que é batido sobre moldes de papel vazado com formatos diversos. Desenhava em todos os pedaços de papel, até que seu pai o levou para estudar desenho com um  senhor que copiava estampas de santos. E então, com 10 anos, fez seu primeiro retrato: Carlos Gomes.
Retrato de Carlos Gomes, 1914. Desenho a carvão sobre papel, 43X42cm. Coleção particular - RJ






Sempre elogiado pela família, cada vez mais estava convencido de que deveria seguir a carreira de pintor.
Aos 15 anos foi estudar na Escola Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, onde teve professores importantes, como Lucílio de Albuquerque, Rodolfo Chabelland, Rodolfo Amoedo e Batista da Costa. Como possuía pouco dinheiro, foi morar em uma pensão, encontrava dificuldades até mesmo para pagar um almoço, mas a sua vontade de vencer era tão forte, que superava tudo.
Aos vinte anos, pintou “Baile na Roça” que foi reconhecido como sua primeira obra de arte. Foi a primeira tela que Portinari vendeu.
Baile na Roça, 1924. Óleo sobre tela, 97X134cm. Coleção Particular - RJ


Participou de diversos concurso, em 1928, foi finalmente premiado, com uma viagem à Europa, pelo retrato que pintou de Olegário mariano, poeta pernambucano. Recebeu então, uma quantia em dinheiro do governo brasileiro e foi para Paris, onde, em 1930, conheceu Maria Victória, jovem uruguaia que ali morava. Casaram-se e viveram na Europa por mais um ano. Lá, ele não pintou quase nada, apenas andou, observou e aprendeu muito. Conheceu obras de diversos artistas, como as do pintor renascentista italiano Giotto. Portinari também apreciava outros artistas: Matisse, que usava cores puras, o alemão Emil Nolde e o italiano Amedeo Modigliani. As técnicas de Van Gogh e de Cézanne foram profundamente esmiuçadas por Portinari.
A saudade do Brasil, porém, crescia dia a dia, e Portinari decidiu rever sua gente e sua terra natal, trazendo Maria, sua grande paixão. De volta ao Brasil, trabalhou como nunca. Pintou diversas telas sobre sua infância, e Brodowski. A obra “Café”, foi pintada nessa época.
Fazia esboços com detalhes e os consultava ao elaborar suas telas. Era também muito cuidadoso com seu material. Usava pincéis importados da Europa, faquinhas e até pequenos bisturis. Sua pintura foi fortemente influenciada por Pablo Picasso: após conhecer o famoso “Guernica”, Portinari chocou o público ao pintar os santos com expressão sofrida, angustiados pelos problemas humanos.  Para ele, “o conteúdo espiritual de um quadro registra a potência de sensibilidade do artista. O lado técnico registra o conhecimento e o desenvolvimento da sensibilidade do artista. A técnica é um meio com o qual o artista transmite a sua sensibilidade”.
Sua pintura torna-se sem regras, sem formas regulares. Sua  preocupação era o “Homem”. Na obra “Lavrador de Café”, uma das mais famosas que pintou, retratou força, movimento, desafio. Observe como o corpo parece estar unido para sempre à terra vermelha, viva, os enormes pés fincados e firmes sugerindo a busca e a conquista da terra. A partir de 1936, , desenvolveu a pintura de murais. Nessa época, o governo brasileiro costumava encomenda-los para serem colocados em prédios públicos. Pintou a afresco os murais do prédio do Ministério da Educação e da Saúde, no Rio de janeiro, e o tema foram os ciclos econômicos do Brasil. Pintou o pau-brasil, a cana-de-açúcar, o gado, o ouro, o fumo, o algodão, a erva-mate, o café, o cacau, o ferro, a carnaúba e a borracha. Portinari afirmava, que “a pintura mural é a mais adequada para a arte social, porque o muro geralmente pertence à coletividade e ao mesmo tempo conta uma história interessando a um maior número de pessoas”.
Já famoso por sua pintura muralista, em 1943, começou a pintar os painéis da Série Bíblica. Neles, o pintor expressa a sua amargura diante da injustiça.
A convite do arquiteto Oscar Niemeyer, em 1944, iniciou as obras de decoração da Igreja de São Francisco de Assis, na Pampulha, em Belo Horizonte. Nessa mesma época, trabalhou nas pinturas da série “Retirantes”. Com essa série, atinge o auge de sua emoção. Resgata imagens de sua infância: famílias pobres e desabrigadas que passavam por sua cidade.  Dois anos mais tarde, iniciou a série “ Meninos de Brodowski” .


Menino de Brodowki , 1946. Desenho a óleo sobre cartão, 94X50cm (aproximadamente). Coleção particular - RJ

menino de Brodowski, 1946. Desenho a óleo sobre papel, 85X49cm (aproximadamente). Coleção particular - Los Angeles - EUA.
















A partir do final da  de 1940, fez uma série de obras tratando de temas históricos. Nessa fase, retoma o trabalho em murais, expressando por meio deles seu olhar sobre os fatos da história do Brasil. Seu painel “Primeira Missa no Brasil”, por exemplo, representa características mais geométricas, utilizando retas paralelas e diagonais, para provocar efeitos especiais.
Em 1956, terminou dois painéis para a Sede das Organizações das nações unidas (ONU), em nova York: “Guerra e Paz”. Nessas obras, usou poucas cores, linhas retas e formas geométricas, com figuras sobrepostas, sem preocupar-se com perspectiva e profundidade. 

Guerra, 1956. Painel a óleo sobre madeira compensada, 1.400X1058cm 9irregular. Coleção Organização das nações Unidas, Nova York, EUA. 


Paz, 1956. Painel a óleo sobre madeira compensada, 1400X953cm (irregular). Coleção ganização Das nações Unidas, Nova York, EUA



Observe e compare os dois quadros: um expressa tristeza e desamparo, o outro, alegria e aconchego.
A obra de Portinari foi intensa e diversificada, pintou tipos regionais do Brasil, como os cangaceiros e os índios carajás, não gostava de pintar retratos por encomenda, preferia retratar sua esposa Maria e os amigos. Pintou também “Desenhos de Israel”, que foram inspirados na paisagem e no povo do país, depois de uma viagem para lá em 1956.
Portinari adorava conversar com as crianças, ele dizia:  “Sabem por que é que eu pinto tanto menino em gangorra e balanço? Para botá-los no ar, feito anjos.” Denise, sua neta, filha de seu único filho, João, foi diversas vezes tema de suas pinturas.


Denise com Carneiro branco, 1961. Óleo sobre madeira, 61X50cm. Coleção particular, Belo Horizonte, Minas Gerais




Assim era Portinari, sua maior preocupação sempre foi expressar o homem por meio de diferentes linguagens e formas. Suas pinturas retratavam nosso país. Misturando as técnicas que havia aprendido à sua personalidade, experimentou novos caminhos para os traços, as cores e as formas que criava.

Sua obra não pode ser rotulada: apresenta contradições e soluções que superam o artista comum. Não pode simplesmente  ser enquadrada em um contexto artístico. Ela deve ser entendida com toda a sua força dramática expressa em cada pincelada.

Muitas pessoas criticavam suas obras, achavam que as figuras tinham formas exageradas, monstruosas, não entendiam, o real significado de sua arte.

Até hoje, existem críticos que provocam polêmica em torno do seu trabalho. Ainda que amplamente reconhecido por seu trabalho no País, Portinari também encontrou críticos e conhecedores de arte dispostos a contestar a justiça da posição alcançada pelo artista. Acusado de desenvolver uma estética de tons fascistas por uns e de adotar um tom excessivamente engajado de “artista de esquerda” por outros ou de apenas reinterpretar o cubismo de Picasso sem desenvolver um estilo próprio, o pintor sobrevive aos seus possíveis pontos fracos, assim como ao próprio mito. Na edição de 23 de junho de 1993 da Revista Veja, o crítico de arte e editor da revista Novos Estudos 9Cebrap), Rodrigo Naves, dedicou duas páginas à tese de que o artista não conseguia libertar-se de um estilo  marcadamente sentimental e não resistia a apelar para as emoções derramadas, ainda que socialmente inócuas, com o intuito de obter ampla difusão e reconhecimento , por meio do que chama de “empatia áspera”. Raramente suas figuras conseguem comunicar ao espaço de todo o quadro drama que em princípio seria seu traço fundamental. E as constantes tentativas de dignificar os trabalhadores, dando-lhes um porte grandioso, terminaram por encontrar pouca eficácia, uma vez que dificilmente aquela conformação se transmite para o restante dos quadros”. Habituado a ouvir e a ler interpretações como essas, e sem mergulhar profundamente nas discussões que cercam a obra de Portinari, o filho do artista, João Candido, costuma afirmar, vendo nisso algo positivo e não como uma deficiência, que seu pai, pintava os trabalhadores de uma foram digna e exuberante .  A influência inegável de Picasso é vista por outros críticos como natural. “O veio realista de Portinari ganha reforço na Europa, na época em que um Picasso neoclássico era o grande modelo” assina-la Annateresa Fabris. “Portinari é moderno dentro das peculiaridades de modernismo no Brasil”, que não teve sincronia com os movimentos estéticos do Velho Mundo.

Portinari faleceu em 1962, aos 59 anos, vítima de intoxicação provocada pelas tintas a óleo que utilizava. Sua principal obra foi deixar gravadas, para sempre, na história e na arte do Brasil, pinceladas que buscavam a perfeição sob um ponto de vista particular, e o amor à sua gente , suas raízes, sua história.  Assim como escreveu Jorge Amado: “ Foi um dos homens mais importantes do nosso tempo, pois de suas mãos nasceram a cor e a poesia, o drama e a esperança de nossa gente. Com seus pincéis, ele tocou fundo em nossa realidade.”
Portinari, Candido
Meu Primeiro Trabalho , 1921 
óleo sobre tela, c.s.d. 
25,5 x 23 cm 
Coleção Particular
  


BIBLIOGRAFIA:

* Candido Portinari, Nereide Schilaro Santa Rosa, Editora Moderna 
* Brincando com Arte Portinari, Angelica policeno Fabri, Editora Noovha América
* Camargo, Ralph Portinari Desenhista, Rio de Janeiro, 1977
* Fazendo Arte com os Mestres, Ivete Rafa, Editora Escolar
* http://blogillustratus.blogspot.com.br/2010/05/candido-portinari.html


Portinari, Candido 
Futebol , 1935 
óleo sobre tela, c.i.d. 
97 x 130 cm 
Coleção Particular


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